"Não oprimirás o jornaleiro pobre e necessitado, seja ele teu irmão ou estrangeiro que está na tua terra e na tua cidade. No seu dia, lhe darás o seu salário, antes do pôr do sol, porquanto é pobre, e disso depende a sua vida; para que não clame contra ti ao SENHOR, e haja em ti pecado." (Deuteronômio 24:14-15; ARA)
Ao
contrário do que muita gente pensa, a Bíblia possui diversas leis de
caráter humanitário, escritas milênios antes da Declaração dos Direitos
do Homem e do Cidadão (1789). Esta foi elaborada na época da Revolução
Francesa e teve um foco maior nos aspectos dos direitos
individuais das pessoas do que em relação às questões sociais,
tornando-se bem permissiva quanto à exploração dos trabalhadores na era
industrial. Pois, somente com o surgimento do movimento socialista,
caracterizado por greves e manifestações dos operários nas ruas, foi que
o Estado começou a preocupar-se efetivamente com a criação de normas capazes
de limitar o abuso dos patrões.
Contudo,
as Escrituras Sagradas sempre cuidaram da proteção e do bem
estar dos economicamente mais fracos. Mesmo numa época em que ainda
havia a escravidão (nada comparado com as atrocidades praticadas contra
os negros no nosso período colonial), os autores bíblicos tiveram
verdadeiros vislumbres da justiça social. Segundo a tradição
judaico-cristã, foi Moisés quem determinou aos israelitas o pagamento em
dia do salário dos trabalhadores levando em conta ai a natureza
alimentar da obrigação. Como grande legislador que se tornou, ele não
desejava que o povo liberto da opressão dos faraós egípcios agisse de
modo semelhante aos seus algozes do passado. Daí a preocupação tanto com
os estrangeiros quanto com os nacionais.
O
fato é que a pobreza pode acabar virando uma condicionante da
liberdade. O trabalhador, por ter que suprir as suas necessidades
básicas e da família, aceita, por livre e espontânea pressão, receber
salários que são aviltantes. Isto sem nos esquecermos da sua exposição
aos riscos profissionais de periculosidade e insalubridade, além da
penosidade de determinadas tarefas. Ou seja, o condicionamento faz com
que o indivíduo abra mão da qualidade de vida que deveria gozar e,
dependendo do caso, negocie até uma parcela da dignidade pessoal que lhe
resta.
Assim sendo, penso que não dá para falarmos em direitos trabalhistas sem levarmos em conta a efetividade das políticas públicas de inclusão social, algo que, de uma maneira primitiva, mas atual, foi tratado também na Bíblia, conforme lemos consultando novamente o livro de Deuteronômio:
"Quando entre ti houver algum pobre de teus irmãos, em alguma das tuas cidades, na tua terra que o SENHOR, teu Deus, te dá, não endurecerás o teu coração, nem fecharás as mãos a teu irmão pobre; antes lhe abrirás de todo a mão e lhe emprestarás o que lhe falta, quanto baste para a sua necessidade (...) Livremente, lhe darás, e não seja maligno o teu coração, quando lho deres; pois, por isso, te abençoará o SENHOR, teu Deus, em toda a tua obra e em tudo o que empreenderes. Pois nunca deixará de haver pobres na terra; por isso, eu te ordeno: livremente, abrirás a mão para o teu irmão, para o necessitado, para o pobre na tua terra." (Dt 15:7-8,10-11)
Nesta outra passagem citada, mais do que uma simples orientação, pode-se verificar um princípio
a ser seguido. Não importa se a assistência será prestada pelo
particular ou pelo Poder Público (hoje em dias é mais adequado que se
faça obrigatoriamente pelo Estado), o certo é que ela deve ser
suficiente e jamais guiada por segundas intenções. Tanto as doações
quanto os empréstimos sem usura devem ser aplicados de acordo com as
necessidades em cada caso, juntamente com serviços públicos de qualidade
para atender os menos favorecidos.
No
Brasil de hoje, apesar de ter ocorrido alguns avanços consideráveis nas
políticas sociais durante os melhores anos da era petista, muito ainda precisa ser concretizado. Nem todos os
trabalhadores conseguem sair do aperto do aluguel e terem a sua casa
própria! A inflação abocanha boa parte da renda das pessoas fazendo com
que o aumento salarial dado no começo do ano se perca nos meses
seguintes. Isto sem nos esquecermos de que os impostos estão por toda
parte, em quase todos os produtos e serviços consumidos, mas retornam de
maneira bem desproporcional para a população com meios de transporte
super lotados e um SUS que mal funciona. Uma doença pode facilmente
desestabilizar a vida de quem labora por causa das dificuldades de
atendimento na rede pública de saúde e das humilhações que, com
frequência, ocorrem nas perícias médicas do INSS.
Porém,
como consequência da boa política assistencial, tem-se um benefício
coletivo que é a prosperidade geral da nação, como se lê na segunda
citação bíblica que fiz acima. O risco de haver pobreza sempre será uma
constante em qualquer sociedade por mais que ela evolua. É justamente
por isso que a assistência não pode jamais ser negada a quem de fato
precisa dela e deve haver continuidade. Logo, fazer uso eleitoreiro das
bolsas sociais seria uma enorme perversidade como muitas das vezes
ocorre na nossa nação.
Neste
primeiro de maio (coincidentemente é o nome da rua onde moro em
Muriqui), apesar de nos depararmos com tantas injustiças ainda
praticadas, o trabalhador sempre deve comemorar com satisfação a sua data.
Precisamos cultivar em nós a esperança por um futuro melhor,
transmitindo-a às gerações seguintes e fortalecendo cada vez mais as
lutas coletivas por um Brasil digno a fim de que realmente nos tornemos
um "país de todos". Pois, como disse o salmista,
"o necessitado não será para sempre esquecido, e a esperança dos aflitos não se há de frustrar perpetuamente" (Sl 9:18).
Um ótimo feriado para todos!
OBS: A foto acima refere-se a uma manifestação ocorrida na cidade do Porto, Portugal, no dia 1º/5/1980. Foi extraída do acervo virtual da Wikipédia com atribuição de autoria a Henrique Matos, conforme consta em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:1%C2%BA_Maio_1980_Porto_by_Henrique_Matos.jpg
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