"Uma só coisa é necessária"

Palavra da Liturgia – Lc 10, 38 a 42


            
Celebrar a vida cristã é acima de tudo acolher quem chega e quem precisa chegar; sentar-se à mesa e juntos repartirem o Pão Eucarístico. Acolher plenamente: com a matéria (pão) e com o espírito cristão (comunhão). Acolher com a alma e o coração.
            
A liturgia deste final de semana nos vem lembrar como é importante na vida comunitária as “Marias e Martas”.
            
A palavra relata a viagem de Jesus a uma aldeia: Betânia. Marta acolheu Jesus em sua casa, preparou todo o ambiente para melhor acolhê-lo, e o fez por amor. Quem acolhe encontra-se com Jesus e pratica na ação o amor concreto e não filosófico.
            
Se não fosse Marta, Maria não estaria aos pés de Jesus.

Mas acolher alguém é ir além das necessidades financeiras e materiais, a matéria é importante, porém não deve ser a principal, os sentimentos de carinho, de amizade, de amor, de admiração, de compromisso e fé ultrapassam a matéria e é o que justamente permanecem. Aqui não é uma questão de dizer o que é mais importante e sim essencial.

Maria acolheu Jesus com o coração, tornou-se amiga de Jesus, por isso Jesus gostava de Betânia, pois a amizade de Maria O cativou e ela cativada por Jesus sentava aos seus pés para conhecê-lo melhor. Muitas vezes erramos quando caímos no ativismo, quando tentamos resolver as coisas, só pelos caminhos humanos, quando deixamos de rezar, de ouvir o Mestre, saber qual sua vontade e o que Ele quer de nós. O ativismo é uma praga do novo século e que tem deixado muita gente na pobreza da matéria e do espírito. O acolhimento de Maria a Jesus é solidário, assim como deve ser solidária a nossa fé, comprometendo-nos e sofrendo junto com os mais sofridos.

Disse Jesus:

“Marta, Marta, andas muito inquieta e te preocupas com muitas coisas; no entanto uma só coisa é necessária...”.

Vivemos numa sociedade agitada e complicada: empresas que exploram seus funcionários trabalhando em horários “malucos”, desrespeitando o domingo, a noite, assim como desrespeitam a vida humana, a família. A produção e o lucro estão acima de tudo e de todos.

O homem não foi feito para o trabalho, mas o trabalho foi feito para o homem.

As conseqüências estão aí: muita gente depressiva, pessoas doentes e escravas do consumismo. Famílias dilaceradas.

Maria nos lembra do tempo em que as pessoas tinham mais tempo para uma boa prosa, tempo de amizades, de diálogo na família e de atenção aos filhos. Tempo que a família se reunia para um diálogo, ir à igreja celebrar a gratidão de poder estar aos pés de Jesus.

Corremos, gastamos, consumimos, adquirimos e nunca estivemos tão pobres de tudo, tão insatisfeitos com tudo, tão solitários e tão autodestrutivos. Acolher é tomar a consciência de que a maioria das coisas que precisamos já temos, pois é dádiva, o restante é consequência. O caminho para aproveitar as oportunidades da vida é o acolhimento.

Maria nos ensina que devemos estar à espera de tudo que vier a nós, sem desejarmos o que não temos. Esta espera não deve ser um desejo e sim uma disponibilidade para acolher. Esta questão de procurar e desejar nos faz sempre reféns e escravos de desejos. A atitude de acolher é sempre um caminho mais exigente.  Porém sem a liberdade é impossível acolher a felicidade. A principal característica d’alma educada é saber acolher.

Optar por Deus e pelas coisas essenciais da vida: amizade, amor, respeito, família, trabalho digno, solidariedade é optar pelo que permanece. O mundo precisa encontrar o equilíbrio entre a ação e a oração, entre a matéria e a espiritualidade, entre o que passa e o que permanece, entre o desejo e a necessidade, entre o que o importa e o que é essencial. Betânia é o lugar ideal para aprendermos isso. Em Betânia aprendemos que uma só coisa é necessária, portanto os que levam a vida de forma simples é que conseguem compreender o que aconteceu em Betânia. A minha vida precisa aprender a ser hospitaleira. Que adianta estruturas se em meu coração não há espaço para o outro e para Deus?

O acolhimento é o cartão de visita da comunidade. As palavras passam, mas um ato de amor e atenção ao próximo é o que fica, “o que lhe não será tirado”.

Que nosso coração seja Betânia, uma casa de acolhimento para o outro e para Deus.


Gilberto Ângelo Begiato

gilberto@comunidadebompastor.com.b

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